O Ministério Público Federal ofereceu denúncia (ID 20128822), em face de VALDOMIRO OCHNER, brasileiro, aposentado, filho de Valdira Ochner e Iman Ochner, nascido aos 23/01/1959, CPF nº
014.137-177-46, residente na Rua Ricardo Pereira Lemos, nº 141, bairro Brasilândia, CEP 02865- 130, São Paulo/SP, atualmente preso, como incurso nas penas dos artigos 241-A e 241-B, ambos da Lei 8.069/90, por
diversas vezes. Arrolou três testemunhas de acusação.
De acordo com a inicial acusatória, entre, pelo menos, os dias 30 de março e 30 de abril de 2019, VALDOMIRO OCHNER teria disponibilizado, transmitido e divulgado pela internet, por meio do programa
de compartilhamento P2P eMule, com vontade livre e consciente, utilizando computador instalado na Rua Ricardo Pereira Lemos, nº 141, Brasilândia, nesta cidade, diversos arquivos de imagens e vídeos de pornografia infantil.
Narra, ainda, a denúncia, que, entre janeiro de 2019 e 30 de abril de 2019, o denunciado VALDOMIRO OCHNER possuiu e armazenou, com vontade livre e consciente, arquivos com imagens e vídeos
contendo cenas de sexo explícito e pornográficas envolvendo crianças e adolescentes.
Recebida a denúncia aos 05/08/2019 (ID 20203010), foi mantida a prisão preventiva do acusado e determinada realização de perícia complementar.
O acusado foi citado e intimado (ID’s 20719725 e 21068716), e apresentou resposta escrita à acusação (ID 21074932), por intermédio de defensor constituído (ID 20226618), em suma, pugnando pela
absolvição, no que se refere ao delito do artigo 241-A, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Não arrolou testemunhas.
Não se visualizando nenhuma causa de absolvição sumária nos termos do artigo 397 do CPP, determinou-se o prosseguimento do feito. (ID 21130858).
Realizada audiência de instrução e julgamento em 02/10/2019, foram ouvidas três testemunhas de acusação e foi realizado o interrogatório do acusado.
Na fase do art. 402 do Código de Processo Penal, nada foi requerido pelas partes (ID 22760529).
Em alegações finais orais, o Ministério Público Federal, em síntese, requereu a condenação do Réu tanto pela prática do crime do artigo 241-A, quanto pela prática do crime do artigo 241-B, ambos do Estatuto
da Criança e do Adolescente, uma vez que disponibilizou, transmitiu e divulgou pela internet através de programa EMule, assim como possuiu e armazenou arquivos contendo imagens e vídeos de sexo explícito e pornográficos
envolvendo crianças e adolescentes. A materialidade delitiva e autoria estão comprovados nos autos e as testemunhas de acusação foram uníssonas em afirmar os fatos narrados na denúncia. Alegou, ainda que o Réu pratica
esses crimes há pelo menos 05 ou 06 anos, de modo que teria transformado esses terríveis crimes como forma de vida, caracterizando habitualidade criminosa (ID 22871967).
Em síntese, a defesa constituída, em alegações finais orais, alegou que o acusado confessou espontaneamente a prática do crime do artigo 241-B do ECA e que, porém, jamais teve a intenção de divulgar, por
qualquer meio imagens ou vídeos com conteúdo de pornografia infanto-juvenil, sendo que o programa utilizado realizava os downloads de forma compulsória, sem sua anuência e sem seu conhecimento. Pugnou pelo afastamento
da imputação pelo artigo 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente por ausência de dolo; requereu a aplicação de eventual pena base no mínimo legal, por se tratar de réu primário e com bons antecedentes; requereu a
aplicação da circunstância atenuante prevista no artigo 65, III, “d” do Código Penal, em face da confissão espontânea, bem como a fixação do regime aberto para início do cumprimento de eventual pena. Alegou, ainda, que,
diferentemente do alegado pela acusação, não há prova do compartilhamento de arquivos contendo Pornografia infanto-juvenil por mais de 05 anos (ID 22871968).
É o relatório.
DECIDO.
Ao acusado é imputada a prática dos crimes previstos nos artigos 241-A e 241-B. ambos da Lei 8069/90:
Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro
registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou
adolescente
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.
A materialidade delitiva restou comprovada pelo auto de prisão em flagrante lavrado aos 30/04/2019, pela 4ª Delegacia de Pol. Rep. Pedofilia (fls. 01/13 - ID 19616940), pelo auto de exibição e apreensão (fl.
17, - ID 19616940), pelo Relatório de cumprimento de mandado (fls. 18/26 ID 19616940) e, especialmente, pelo Laudo Pericial n° 202.297/2019 (fls. 122/ 161- ID19821302), o qual concluiu pelo armazenamento e
compartilhamento por sistema P2P de arquivos contendo fotos e vídeos com pornografia infanto-juvenil no computador apreendido nos autos.
No mesmo sentido a autoria restou comprovada pelos documentos produzidos durante a fase de inquérito, em especial o auto de prisão em flagrante (fls. 01/13 - ID 19616940), o Relatório de cumprimento de
mandado (fls. 18/26 ID 19616940) e o Laudo Pericial n° 202.297/2019 (fls. 122/ 161- ID19821302), em que se demonstrou o armazenamento e compartilhamento por sistema P2P de arquivos contendo fotos e vídeos com
pornografia infanto-juvenil no computador apreendido na residência do acusado, tendo sido corroborada, ademais, pela prova colhida durante a instrução processual.
A seguinte prova oral foi colhida em audiência:
A testemunha de acusação Rainer Wolfgang Kawrowski Junior, compromissada, disse que a equipe saiu para cumprir o mandado, conforme determinação judicial, fizeram os procedimentos de praxe,
localizaram o endereço e apresentando-se como policial, foram recebidos com urbanidade pelo acusado – a quem reconhece em audiência. Verificaram que no pavimento superior da casa havia um equipamento de
informática que estava ligado e em utilização. Fazendo a verificação, constatou-se que ele tinha arquivos em condições de compartilhamento. O computador, aparentemente, estava em compartilhamento de
material de pornografia infantil. Com base nisso foi dada voz de prisão, encaminhando-se o acusado para unidade policial para as condutas cabíveis. A máquina que parecia estar em compartilhamento porque o
computador ligado mostra uma mensagem de que está em uma operação de upload ou download. Essa verificação foi feita numa análise prévia, pois o computador ainda passaria por perícia. Quem fez a
verificação foi o policial Hipólito. O depoente não mexeu na máquina. Quando chegaram, foram levados pelo acusado até o equipamento de informática, o qual visivelmente estava ligado. Questionaram o acusado e ele
afirmou que vinha praticando esse tipo de situação. Visualmente, pareceu-lhe que a máquina estava em operação de compartilhamento, pois apareciam ícones de programas que são usualmente utilizados
para compartilhamento de material de pornografia. Esses programas são os que que utilizam o sistema P2P, de modo geral, o eMule. Não sabe dizer se, naquele momento, o computador estava com imagens de
pornografia abertas ou não.
A testemunha de acusação Carlos Nilton de Castro compromissada, disse que foram cumprir mandado de busca e apreensão na casa do Sr. Waldomiro, a quem reconhece presente na audiência, e, chegando
lá, ele os atendeu de pronto. Identificaram-se e disseram que tinham um mandado para cumprir. Ele franqueou a entrada no imóvel e, então, foi pedido que mostrasse onde estavam os dispositivos eletrônicos do imóvel.
Chegando lá num dos quartos, no topo, verificou que o aparelho estava online em um programa do qual não se recorda se era o eMule ou o Torrent baixando aquelas coisas de pedofilia infantil. Conversaram
com o acusado e ele demonstrou ter ciência do fato de estarem lá, de pronto afirmando que fazia algum tempo que estava baixando.
A testemunha de acusação Marcelo Hipólito de Souza compromissada, disse que se tratou de um mandado de busca e apreensão decorrente do monitoramento de programas de compartilhamento a que a
delegacia tem acesso, medida que a juíza da Barra Funda autorizou. Realizaram as diligências de forma velada e confirmaram que o acusado morava no local. Depois, levaram a efeito o mandado de busca. Reconhece o acusado
presente em audiência. Mostraram o mandado e o acusado franqueou o acesso aos policiais, Informam o acusado do que se tratava e pediram que informasse quais são os dispositivos eletrônicos que estariam na residência. O
acusado indicou que no quarto dele teria um computador. Chegando lá, verificaram que realmente o computador continha programas de compartilhamento de pedofilia. O computador estava ligado no
momento da presença dos policiais e o programa estava ativo, o que caracterizou o compartilhamento. O próprio acusado informou quais locais estavam armazenados e in loco foi possível ver as pastas em
que estavam os arquivos e uma quantidade considerável de material foi encontrada. Fizeram a apreensão dos dispositivos eletrônicos e encaminharam à autoridade policial e efetuaram a prisão em flagrante delito.
Chegou a visualizar muitas imagens de pedofilia. A quantidade de arquivo se dava em gigabytes, pois era bastante considerável. O compartilhamento ocorre quando o programa está ativo e, lá chegando,
constataram que o programa estava ativo. Era o programa eMule que estava ativo, mas ele tinha dois programas: eMule e Torrent. No programa, há uma aba que permite visualizar que, no mesmo momento
em que o programa está fazendo download, ele também estava fazendo upload de arquivos. O réu não demonstrou nenhuma resistência à diligência e, de pronto mostrou quais eram os programas e arquivos. O acusado
disse que realmente baixava esse tipo de arquivo há algum tempo.
O acusado VALDOMIRO OCHNER, interrogado em Juízo, declarou que é aposentado. Foi instrutor de automação industrial no SENAI. Tem formação em pedagogia tem “pós” em gerencia de
manutenção. Sua formação é na área mecânica. Tem renda de R$ 4.000,00 reais. É solteiro e não tem filhos. Reside em imóvel próprio. Mora sozinho. Nunca foi processado ou investigado. Em relação à acusação que lhe é
feita, confirmou que tem problemas pelo fato de ser sozinho, sendo que perdeu um pouco interesse sexual e olhava esse tipo de imagem como curiosidade, mas não tem fixação por adolescentes. Em relação ao que
os policiais relataram, esclarece que o computador ficava sempre ligado e que o fato do software estar ativado não significa que estava baixando aquele tipo de imagem. Gosta muito de televisão e o software estava ativado
baixando novela, filmes, música e também, mas não necessariamente, esse tipo de arquivo. Sabe que, para compartilhamento de um determinado arquivo, ele tem que estar em um ponto específico do computador. Se
não estiver, ele não está sendo compartilhado. Tanto, que, quando mostrou para os policiais onde os arquivos estavam armazenados, disse para eles que nunca colocou nada na rede. Usava o programa eMule. Sabe que
o programa permite que se baixe e compartilhe frações do arquivo. Enquanto se está baixando um arquivo, o programa permite que outras pessoas peguem também. Quando começou a usar o eMule, o fez para
baixar música, e sabia que o programa baixava arquivos. Depois, quando negou ter compartilhado arquivos, o delegado explicou como as coisas funcionavam nessa parte de compartilhamento. Usava o programa eMule, o qual
permite baixar qualquer coisa da internet. Nesse enquanto está baixando num arquivo, pode acontecer de alguém baixar também esse arquivo, mas, essa pessoa pega frações do arquivo. Não sabia disso no início, porque seu
objetivo era baixar o que precisava. Quem explicou que o programa também disponibilizava foi o delegado, quando de sua prisão. Antes, tinha um conhecimento vago de que o programa poderia disponibilizar os
arquivos para alguém. Sempre achou que o programa só baixava. Tem a esclarecer que começou a fazer isso há pouco tempo, cerca de 9 meses, um ano, no máximo.
A prova oral produzida em Juízo corroborou as oitivas na fase policial no sentido de que o acusado foi preso em flagrante delito na posse de grande material com conteúdo de pornografia infanto-juvenil
armazenados em seu computador e disponibilizando tais arquivos na internet mediante utilização do programa de compartilhamento P2P Emule, restando provada, portanto, a autoria delitiva.
Observo também que o dolo, elemento subjetivo do tipo, restou bem demonstrado. Em seu interrogatório realizado na fase policial, o acusado afirmou que realmente baixa na internet imagens com conteúdo
pornográfico infantil há aproximadamente 05 ou 06 anos e que tem ciência de que o programa eMule, ao mesmo tempo que faz o download de arquivos, permite seu compartilhamento por outros usuários.
Em juízo, confirmou que baixou conteúdo pornográfico envolvendo crianças e adolescentes por curiosidade e que usava o programa eMule. Demonstrou também ter conhecimento acerca da função do referido
programa ao descrever que o programa permite que se baixe e compartilhe frações do arquivo. Ainda que tenha alegado, em seu interrogatório judicial, que o pleno funcionamento do programa somente foi explicado pelo
delegado quando de sua prisão, admitiu que, antes disso, tinha ciência, ainda de que vaga, de que o programa também serviria para compartilhamento de arquivos.
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 26/11/2019 561/795