Edição nº 223/2017
Brasília - DF, disponibilização terça-feira, 28 de novembro de 2017
Não descuido da primariedade e da ausência de maus antecedentes nem tampouco da senilidade do autuado. É que a gravidade em concreto
do caso justifica a segregação cautelar. De se ver que o modo de agir descrito no APF evidencia o fato de aproveitar-se da coabitação com a
vítima para dela se aproveitar. Há mais: a segregação cautelar também se impõe diante de possível intimidação da vítima e de testemunhas,
ante a relação de afeto entre o autuado e a avó da criança. Todo esse cenário justifica a segregação cautelar, de um lado, para garantir a ordem
pública, freando a senda criminosa; de outro lado, para preservar a instrução criminal e a integralidade da vítima.? (ID 2760690). Pelo excerto
acima transcrito, nota-se que a prisão preventiva da paciente foi decretada com fundamento na garantia da ordem pública e na conveniência da
instrução criminal. Pois bem. Inicialmente, cumpre anotar que não há nos autos nenhuma evidência de que o paciente tenha ou esteja ameaçando
a vítima ou qualquer testemunha. Além disso, há medida protetiva de afastamento do lar, de modo que não vislumbro qualquer risco à instrução
processual. Por outro lado, o fundamento da garantia da ordem pública se mostra latente, considerando modus operandi supostamente utilizado
pelo paciente, justificando sua custódia cautelar. A garantia da ordem pública está elencada no artigo 312 do Código de Processo Penal como um
dos fundamentos a justificar a prisão preventiva de uma pessoa. É certo que se trata de um conceito jurídico aberto, o que necessitada do trabalho
da doutrina e da jurisprudência para concretizá-lo da melhor forma, garantindo por um lado os direitos constitucionais dos acusados em geral e,
por outro, o interesse da sociedade em manter a tranqüilidade social. Nesse diapasão, tenho entendimento no sentido de que o conceito ordem
pública deve ser interpretado como instrumento de manutenção ou de restabelecimento da tranqüilidade do meio social que foi desordenado pela
periculosidade do agente, pelo fundado receio de reiteração da prática criminosa, pela gravidade concreta da conduta a ele imputada demonstrada
pelo modus operandi de sua ação. A respeito da garantia da ordem pública como fundamento da prisão preventiva, ensina-nos Rogério Schietti
Cruz: ?Daí por que parece ser sustentável o entendimento de que é válida e conforme o Direito a prisão preventiva para a garantia da ordem
pública, de modo a evitar a prática de novos crimes pelo investigado ou acusado, ante sua periculosidade, manifestada na forma de execução do
crime, ou no seu comportamento anterior ou posterior à prática delitiva.? (CRUZ, Rogério Schietti. PRISÃO CAUTELAR ? dramas, princípios e
alternativas. 3ª ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2017, p. 264). Nesse sentido, leciona Renato Brasileiro de Lima: "No caso de prisão preventiva
com base na garantia da ordem pública, faz- se um juízo de periculosidade do agente (e não de culpabilidade), que, em caso positivo, demonstra
a necessidade de sua retirada cautelar do convívio social. Portanto, de acordo com essa corrente, a prisão preventiva poderá ser decretada com
fundamento na garantia da ordem pública sempre que dados concretos - e não pode presumir a periculosidade do agente a partir de meras
ilações, conjecturas desprovidas de base empírica concreta - demonstrem que, se o agente permanecer solto, voltará a delinquir. [ ] Todavia,
demonstrada a gravidade em concreto do delito, seja pelo modo de agir, seja pela condição subjetiva do agente, afigura-se possível a decretação
da prisão preventiva, já que demonstrada sua periculosidade, pondo em risco a ordem pública.". (LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo
Penal. 4a ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2016, p. 938/939.) A propósito, confira-se julgado do Supremo Tribunal Federal: "EMENTA Habeas
corpus. Processual Penal. Sonegação de contribuição previdenciária (CP, art. 337-A). Prisão preventiva (CPP, art. 312). Pretendida revogação.
Impetração dirigida contra decisão do Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu medida liminar requerida pela impetrante. Incidência da Súmula
no 691 da Suprema Corte. Inexistência de ilegalidade flagrante a justificar a superação do enunciado em questão. Periculosidade em concreto
dos pacientes. Modus operandi da conduta criminosa. Crime perpetrado por organização criminosa de forma habitual. Real possibilidade de
reiteração delitiva. Decreto prisional devidamente fundamentado. Habeas corpus não conhecido. 1. A Súmula no 691 do Supremo Tribunal Federal
somente admite mitigação na presença de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou teratologia, o que não se verifica na hipótese em exame.
Precedentes. 2. Registre-se que o decreto prisional dos pacientes apresentou fundamentos mais do que suficientes para justificar a privação
processual de suas liberdades, porque revestido da necessária cautelaridade, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. Mostrase idôneo o decreto de prisão preventiva quando assentado na garantia da ordem pública, ante a periculosidade do agente, evidenciada não
só pela gravidade in concreto do delito, em razão de seu modus operandi, mas também pelo risco real da reiteração delitiva. 4. Habeas corpus
do qual não se conhece.(HC 128779, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 20/09/2016, PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-212 DIVULG 04-10-2016 PUBLIC 05-10-2016, grifou- se). No mesmo toar, já se pronunciou esta Turma Criminal: "HABEAS CORPUS.
PRISÃO PREVENTIVA. ROUBO MAJORADO TENTADO. PORTE DE ARMA. CORRUPÇÃO DE MENORES. RECEPTAÇÃO. GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA. GRAVIDADE EM CONCRETO. ORDEM DENEGADA. 1. A garantia da ordem pública está elencada no artigo 312 do Código
de Processo Penal como um dos fundamentos a justificar a prisão preventiva de uma pessoa. Tal conceito deve ser interpretado como instrumento
de manutenção ou de restabelecimento da tranquilidade do meio social que foi desordenado pela periculosidade do agente, pelo fundado receio
de reiteração da prática criminosa, pela gravidade concreta da conduta a ele imputada demonstrada pelo modus operandi de sua ação. 2. No
caso, a prisão preventiva do paciente está fundamentada na gravidade em concreto dos crimes praticados pelo paciente, o qual estava em
um veículo produto de crime, dentro do qual havia arma de fogo e munição e tentou roubar outro automóvel mediante concurso de agentes e
com emprego de arma de fogo, sendo que seu comparsa era menor de idade. Todo esse cenário, obviamente, evidencia que o paciente não é
iniciante no mundo do crime, muito embora não tenha outras passagens. Além disso, todas essas práticas delitivas em conjunto revelam a sua
periculosidade social, haja vista causar severa intranqüilidade social, justificando sua custodia cautelar como garantia da ordem pública. 3. O
fato de o paciente supostamente ter residência fixa, por si só não autoriza a sua liberdade quando estão satisfeitos os requisitos do artigo 312
do Código de Processo Penal, o que, a contrario sensu, também repele a pretensão de que fossem determinadas outras medidas cautelares
diversas da prisão para a hipótese dos autos. 4. Ordem denegada.?(Acórdão n.1052476, 20170020193299HBC, Relator: MARIA IVATÔNIA 2ª
TURMA CRIMINAL, Data de Julgamento: 05/10/2017, Publicado no DJE: 09/10/2017. Pág.: 310/326). O Superior Tribunal de Justiça também
comunga do mesmo entendimento: "RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ROUBO CIRCUNSTANCIADO. PRISÃO EM FLAGRANTE.
CONVERSÃO EM CUSTÓDIA PREVENTIVA DE OFÍCIO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. ART. 312 DO CPP. PERICULUM LIBERTATIS.
FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. EXCESSO DE PRAZO PARA ENCERRAMENTO DO FEITO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. RECURSO NÃO
PROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que a conversão da prisão em flagrante em custódia preventiva pelo
Juízo monocrático, independentemente de representação da autoridade policial ou do Ministério Público, encontra respaldo no art. 310, II, do
Código de Processo Penal. Precedentes. 2. A jurisprudência desta Corte Superior é firme em assinalar que a determinação de segregar o réu deve
efetivar-se apenas se indicada, em dados concretos dos autos, a necessidade da cautela (periculum libertatis), à luz do disposto no art. 312 do
CPP. 3. O Juízo singular, ao decretar a prisão preventiva, evidenciou a periculosidade do recorrente e a consequente necessidade de preservação
da ordem pública, ante o risco de reiteração delitiva do acusado (que registra passagens anteriores pelo suposto cometimento dos crimes de
receptação, uso de drogas e tráfico de entorpecentes) e o modus operandi adotado por ele e pelo outro agente na prática ilícita (apontaram
arma de fogo para a cabeça da vítima, funcionária do estabelecimento comercial onde ocorreram os fatos, para forçar-lhe a entregar o dinheiro).
4. A questão atinente ao excesso de prazo para o encerramento do feito não foi apreciada no acórdão impugnado, de forma que seu exame
diretamente por esta Corte Superior importaria em indevida supressão de instância. 5. Recurso não provido." (RHC 79.655/MG, Rel. Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 04/04/2017, DJe 17/04/2017). No caso, segundo consta no Relatório do Inquérito (ID
2734744), a mãe da vítima relatou que ambas moram no mesmo lote do que o paciente, o qual é casado com a avó da vítima. Anotou que no
dia dos fatos viu sua filha na sala da casa do paciente com ele, momento em que ela estava com calcinha abaixada e com a saia levantada e o
paciente sentado ao lado dela com a mão em sua genitália. A mão da vítima diante disso perguntou a sua filha o que acontecia, tendo respondido
que ?ele pediu para eu tirar a calcinha, aí ele apertou.? Diante disso, empurrou o paciente e pegou sua filha no colo, ligando para a polícia em
seguida. Nota-se que o paciente, segundo o apurado, teria se aproveitado da coabitação entre ele e a vítima, além do abuso de confiança, para
praticar atos libidinosos com criança de apenas 7 (sete) anos de idade. Esse proceder se mostra grave e exige uma resposta estatal severa,
de modo a resgatar a tranquilidade social fraturada com a suposta prática criminosa perpetrada pelo paciente. Destarte, a custódia cautelar do
paciente se mostra justificada com fundamento na garantia da ordem pública em virtude da gravidade em concreto do crime revelada pelo modus
operandi empregado, o que denota também sua periculosidade social. Por fim, o fato de o paciente supostamente ter residência e trabalho fixo,
por si só, não autoriza a colocação em liberdade quando estão satisfeitos os requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, o que, a
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